21 de janeiro de 2009

O poder do constrangimento

Em diversos blogs de pedestres e ciclistas, eu vejo que as pessoas se sentem impotentes diante de uma máquina de 2 toneladas na sua frente. E com razão. Porém, essa mesma máquina é operada por um ser humano. Mais razão ainda para ter medo? Sim e não.

Sim porque os seres humanos falham. Quando um motorista falha, quase sempre, alguém acaba ferido ou morto. Não é à toa que nos filmes futuristas, os veículos são conduzidos por um sistema automático qualquer. A presença de um ser humano ali é um risco constante.

Por outro lado, seres humanos (até mesmo motoristas) têm sentimentos tais como compaixão, medo e vergonha. E isso, de vez em quando, pode ser útil.

Ontem, eu estava desembarcando do ônibus que vai do Metrô Tatuapé ao Aeroporto de Guarulhos. O ônibus tem piso baixo, o que significa mais ou menos da altura da calçada. Porém, no ponto final, havia um carro parado no ponto de ônibus, com um motorista tranquilamente cochilando enquanto aguardava algum passageiro chegar. O motorista do ônibus não pensou duas vezes: colocou todo mundo pra descer no meio da rua, com mala e tudo.

Eu podia, é claro, ter reclamado com o motorista do ônibus. Aí eu pensei: o coitado já trabalha no trânsito de SP, não vou estressá-lo mais ainda. Vou reclamar com o verdadeiro culpado: o sujeito folgado que parou o carro em frente à placa do ponto de ônibus e foi tirar uma soneca.

Sem brigar, disse "oi, com licença, o senhor está parado no ponto de ônibus" e apontei pro pessoal descendo no meio da rua atrás de mim. Ele me olhou de alto a baixo como quem diz "quem é você". Eu insisti: "o senhor está atrapalhando, aqui é um ponto de ônibus", mostrei a placa, e fui embora pegar meu voo. Quinze segundos depois, o ponto de ônibus estava desocupado.

É o poder do constrangimento. Deveríamos tentar isso mais vezes. Às vezes, funciona.

A propósito, se não funcionar, não compre briga sozinho: pedestres e ciclistas são mesmo o lado mais fraco da corda.

8 de janeiro de 2009

"Manda quem pode, obecede quem tem juízo"

Esse post é fruto de uma discussão na lista de e-mails do Transporte Ativo.

O Fantástico apresenta uma nova série sobre finanças pessoais: chama-se "Manda quem pode, obedece quem tem juízo". No quadro, o orçamento da família fica na mão de uma menina adolescente, sob a orientação de um especialista no assunto.

A tal família, composta de pai mecânico, mãe dona-de-casa e 3 filhas adolescentes tem uma renda mensal de R$ 2.000 e mora numa casa própria, boa mas simples, em um bairro popular do Rio. Apesar do aperto, eles têm um Fox novinho, pelo qual pagam uma prestação de R$ 691!

Como bem apontado pelo colega listeiro Alvaro Berbel, entre as dicas de economia doméstica do especialista não estava a venda do veículo. Então: será que se desfazer do carro melhoraria a situação da família? Ou eles acabariam gastando mais andando de ônibus?

O pai trabalha, mas pode ir de bicicleta, como mostrado na própria reportagem. Suponho que as filhas estudem em colégios públicos, uma vez que em nenhum momento aparecem mensalidades ou matrícula de escola e nem material escolar, e portanto não pagariam ônibus de 2ª a 6ª-feira.

Num cenário otimista, durante a semana, a mãe conseguiria cuidar de seus afazeres a pé. Uma saída de ônibus no sábado ou no domingo custaria à família 10 passagens. Como a tarifa no Rio é R$ 2,20, teríamos R$ 88 por mês. Economia: R$ 603 ou 30% do orçamento doméstico + gasolina + IPVA.

Num cenário conservador, digamos que a mãe gaste 3 passagens por dia para ir ao banco, supermercado, etc., então 21 por semana. No final de semana, digamos que eles saiam 2 vezes, que dá 4 passagens para cada pessoa, ou 20 por semana. Seriam então 180 passagens por mês. Isso dá R$ 396. Economia: R$ 295 ou 15% do orçamento doméstico + gasolina + IPVA.

Mas vamos dizer, num cenário pessimista, que todo mundo andasse de ônibus todos os dias, pagando, e alguém andasse ainda 2x por dia. Estaríamos falando de 360 passagens de ônibus por mês, ou R$ 792. Ou seja, R$ 99 a mais que a prestação do carro. Mas o carro ainda tem gasolina, manutenção (eu sei, o pai é mecânico, mas as peças não devem ser de graça) e IPVA, e no Rio, é bom ter seguro. Economia: pelo menos R$ 60 ou 3% do orçamento doméstico (sem contar as passagens que eles já gastam hoje).

Para uma família que está comprando miojo no cartão de crédito, qualquer uma das alternativas seria um alívio, não?

2 de janeiro de 2009

Feliz Ano Novo sem carro!

Nota: Precisei ficar sem escrever no blog algumas semanas, mas estou de volta.

Pela primeira vez, passei o Ano Novo em Brasília, onde moro. Normalmente, eu iria para o Rio de Janeiro.

Ir para o Rio é quase uma garantia de passar o réveillon sem carro, a não ser que você queira se aborrecer bastante. Há 3 anos atrás, resolvi ir de carro para Copacabana. Deixei minha esposa no apartamento de uns amigos e fui procurar vaga para estacionar. Tive que dirigir até o Catete (5 km) para encontrar uma. Isso porque tive sorte.

Esse ano, fomos para a Esplanada dos Ministérios. Não pela música, mas pelos fogos. O GDF previa 400 mil pessoas. É gente à beça. Na Rodoviária, tinha ônibus, é claro, vindos das cidades satélites. Mas quem mora no Plano Piloto tinha que ir a pé ou de carro. Fui a pé e em meia hora de caminhada, não vi um ônibus sequer.

O resultado foi o previsível. Milhares de carros para estacionar. O problema não foi exatamente falta de vagas -- infelizmente, a Esplanada é um grande estacionamento hoje em dia. O problema é que os motoristas, folgados como sempre, não queriam parar nas vagas mais distantes.

E aí começou o caos. Centenas de carros estacionados em cima das calçadas. Sobre os viadutos da L2, mais algumas dezenas. Outros tantos pararam nos gramados dos acessos. Teve gente estacionada até no ponto de ônibus. (Não, não é em frente ao ponto de ônibus. Foi dentro do ponto de ônibus mesmo.)

Fiquei feliz por ter ido a pé. Quer coisa pior que começar o ano já dando uma de espertinho?