Segunda-feira, 22 de setembro de 2008. Para alguns poucos em Brasília, hoje é o "Dia Mundial Na Cidade Sem Meu Carro". Para a grande maioria, infelizmente, hoje é um dia como outro qualquer.
Para os 1 milhão de motoristas brasilienses, tudo está absolutamente normal. As 14 faixas dos Eixos Rodoviários estão abertas, assim como as 12 do Eixo Monumental e as vias W3, L2 e L4. Os automóveis ocupam os estacionamentos da Esplanada como em qualquer outro dia. Quem pára o carro em pleno espaço público no Setor de Autarquias o fez hoje como faz sempre, ou seja, contando com a conivência do DETRAN e da PM.
Para os 2,3 milhões de habitantes que não têm carro, também nada extraordinário está acontecendo hoje. Para essa gente, que é a maioria da população, não custa lembrar, não existe um Dia Sem Carro. A nossa "Cidade Sem Meu Carro" acontece 365 dias por ano, faça chuva ou faça sol.
Os "Sem Meu Carro" queriam ver, nem que fosse por um diazinho só, essa cidade ser um pouco menos difícil. Mas nada de diferente está acontecendo hoje. Os ônibus não estão mais cheios, nem mais vazios. As linhas e tarifas são as de sempre. Os zebrinhas* novos continuam dando as mesmas voltas dos zebrinhas velhos. O metrô não tem integração. Os buracos nas calçadas estão lá. As passarelas sob o Eixão seguem escuras e fedorentas. O trânsito continua seguindo a lei do mais forte e ameaçando ciclistas e pedestres.
Ainda assim, tomamos o transporte coletivo, caminhamos e pedalamos, e seguimos nossa vida sem carro. Sem protestar, sem aparecer no jornal e sem fazer um "Dia Mundial" por dia.
Na visão dos motoristas, quando se tira o "Meu Carro", sobra a só a "Cidade Sem". Cidade Sem transporte de qualidade, Cidade Sem calçadas, Cidade Sem ciclovias, Cidade Sem qualquer coisa que faça alguém abrir mão do automóvel. Mas ninguém teve coragem de tirar o motorista de seu conforto, mesmo por um dia.
Ao viver sem carro, a gente aprende que a "Cidade Sem" pode ser difícil, mas não é impossível. O "Dia Sem Carro" deveria ensinar isso: que é possível um dia, uma semana, ou um ano sem carro. Que a vida sem carro depende mais da vontade de cada um do que da vontade do Governo, pois as soluções cotidianas podem não ser as melhores, mas existem.
Enfim, fica a pergunta: se nós já sabemos a lição, e quem deveria aprendê-la não está sendo convidado a refletir, qual o sentido desse "Dia Sem Carro"? É colocar o Ministro das Cidades por 5 minutos dentro de um ônibus ou pedalando em uma enorme calçada, cercado de seguranças, para tirar fotos? É fazer mais um seminário cheio de promessas e discussões sobre problemas para os quais já se sabe a solução, mas não se quer aplicá-la?
Fernando Pessoa dizia que "tudo vale a pena, quando a alma não é pequena". Nos próximos 364 dias, pensarei assim. No entanto, neste dia 22 de setembro de 2008, despeço-me com as palavras revoltadas de Caetano Veloso:
"(...) Vão sempre matar amanhã o velhote inimigo que morreu ontem. Vocês não estão entendendo nada, nada, nada. Absolutamente nada. Hoje não tem Fernando Pessoa! (...)"
Porque, sinceramente, esse Dia Sem Carro não vale a pena!
* Zebrinha é o apelido pelo qual são conhecidos os micro-ônibus que circulam no Plano Piloto em Brasília.
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2 comentários:
Curiosidades de uma grande cidade.
O que me alucina, é ver que todas as grandes/médias cidades Brasileiras, convivem com o mesmo problema: a Imobilidade humana - o caos motorizado se aproxima.
Menos um Carro!!
Essa onda pega.
Hoje, eu e meu filho circulamos, trabalhamos e estudamos utilizando nossas bikes.
Literalmente, um dia sem carro, ou melhor, dois carros a menos no dia de hoje.
Ficamos satisfeitos com isso e esperamos que as promessas do Governo do Distrito Federal sejam cumpridas, relativamente a construção de ciclovias e ciclofaixas.
Parabéns pelo blog.
Osvaldo Nunes
Brasília
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